Quem sou eu

Minha foto
Belo Horizonte, Minas Gerais, Brazil
Sou um homem sensível. Amo a natureza e os animais e sou adepto da filosofia da "Ecologia Profunda". Sou taoísta, vegetariano e apaixonado pela cultura tradicional chinesa e indígena brasileira. Valorizo as coisas simples da vida e sou extremamente ANTI-MATERIALISMO e ANTI-CONSUMISMO. Sou do signo de peixes, ascendente em libra, signo do horóscopo chinês cavalo, elemento terra, signo no horóscopo xamânico Lobo. Facebook: Paulo H. M. Lütkenhaus. Bem vindos ao meu singelo espaço. Opiniões, críticas e/ou sugestões serão bem aceitas. Siga meu blog. Obrigado por sua visita!!!

Diagrama de Venn das Principais Vertententes Políticas Existentes no Mundo

Diagrama de Venn das Principais Vertententes Políticas Existentes no Mundo

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Artigo de Reinaldo José Lopes - Bom para se pensar...

Faça a coisa certa
Os leitores desta coluna talvez se lembrem da mania do escriba que vos fala de introduzir assuntos com alguma citação literária afrescalhada. Só para não perder o costume, anotem aí: Nature, red in tooth and claw – “Natureza, rubra em dente e garra”, dizia o britânico Alfred, Lorde Tennyson, em seu poema “In Memoriam A.H.H.”, de 1849. A obra é dez anos mais velha que “A Origem das Espécies”, de Darwin, mas esse pedaço de verso acabou virando uma das caricaturas favoritas do mundo visto pelas lentes da seleção natural. A natureza darwiniana, tal como a do poema, seria essencialmente sanguinolenta – um lugar desagradável e amoral, no qual tudo é permitido em nome do sucesso reprodutivo. Certo e errado? Ora, isso é para os fracos.
Alguns dos inimigos ferrenhos da biologia evolutiva deitam e rolam em cima dessa caricatura, argumentando que aceitar a seleção natural como o principal mecanismo gerador da diversidade da vida equivale a atirar pela janela as conquistas mais caras à moralidade ocidental. Vamos deixar de lado o detalhe de que um fato rejeitado pela nossa ideologia não vai embora nem deixa de ser um fato por causa disso. Deixemos de lado, também, a boa e velha falácia naturalista, que eu já tive ocasião de malhar aqui mais de uma vez: dizer que algo é natural não equivale a dizer que aquilo é o certo. A questão aqui é mais básica. OK, a biologia evolutiva ensina que os seres vivos às vezes são um bocado filhos da mãe quando querem passar seus genes adiante, mas também sugere que o nosso senso de certo e errado pode ser usado para os mesmíssimos fins. Ser bondoso e compassivo, do ponto de vista da seleção natural, pode ser uma estratégia tão válida quanto tentar passar a perna em todo mundo. E é isso que quero demonstrar nos próximos parágrafos.

Voz do coração
Como é sempre bom começar no nível micro para depois chegar ao macro, lembremo-nos, em primeiro lugar, de que nenhum homem é uma ilha. Aliás, nenhum primata é uma ilha, poucos mamíferos são uma ilha, e há inúmeras espécies de vertebrados e invertebrados que jamais serão ilhas. A vida em sociedade é uma excelente estratégia evolutiva, “inventada” (inconscientemente, claro, pelamordeDeus) inúmeras vezes reino animal afora. E a essência da vida social é a interdependência entre os membros do grupo. Antes que os humanos criassem a monarquia absoluta e o monopólio da força (leia-se: da capacidade de encher os outros de porrada) pelo Estado, nenhum animal era poderoso o suficiente para fazer o que quisesse com os membros de seu grupo. Embora os aproveitadores sempre façam das suas, há uma recompensa clara para as sociedades capazes de detectá-los e puni-los.
Essa é uma das raízes das nossas emoções sociais: nosso senso de justiça, a raiva que sentimos diante de trapaceiros e safados em geral, parece derivar diretamente da necessidade de manter os trapaceiros sob controle e salvaguardar as vantagens da vida em grupo. A segurança ligada a andar em bando, o compartilhamento de comida, o uso de sentinelas para alertar contra predadores, entre outros prós de viver em sociedade, são maximizados para todos se ninguém resolver bancar o espertinho.
De forma mais positiva, a vida em grupo também impulsiona instintos como a empatia e a solidariedade, em especial porque, ao conviver no mesmo elemento social, a tendência é que haja interações repetidas entre os vários membros do bando. Passa a valer o lema de que uma mão lava a outra: o instinto de ajudar um companheiro necessitado, que vai se lembrar da boa ação mais tarde, reverte-se em vantagem para você quando for a sua vez de estar em apuros.
Parece até piada, mas os morcegos-vampiros, esses monstrinhos legendários, representam o caso mais saliente de troca de gentilezas do gênero mencionado acima. É relativamente comum que, se um dos bichos alados obtém uma quantidade particularmente substanciosa de sangue em dada noite, ao menos algumas gotas do líquido vão para outro morcego que não conseguiu caçar e poderia morrer de inanição. E o favor costuma ser devolvido com freqüência.

Um conto de dois prisioneiros
Até aqui, espero que tudo esteja fazendo sentido. Temos, no entanto, um problema. Uma sociedade muito certinha, em que todo mundo cumpre as regras, pode se tornar presa fácil de trapaceiros que tomam partido da incapacidade dos outros de coibir sua ação. Afinal, beneficiar-se da proteção social sem ter de pagar o preço da reciprocidade (ou seja, de também seguir as regras) pode ser muito bom para o trapaceiro e sua descendência. Com isso, a confiança que é a base de qualquer interação social corre o risco de se esvair e levar tudo para o buraco. Trata-se, no fundo, de uma variante do famoso Dilema do Prisioneiro, um dos jogos mais simples e fascinantes que existem.
O nome vem do cenário mais comum para o jogo, que na verdade envolve dois prisioneiros. Imagine que você e um comparsa cometeram um crime, foram parar no xilindró e estão aguardando julgamento em celas separadas. E, separadamente, são interrogados. Cada um dos policiais que estão tentando cooptar vocês oferece a liberdade caso um resolva dedar o outro. Se nenhum de vocês entregar o outro, o mais provável é que ambos cumpram uma pena leve e sejam libertados. Se um trair o companheiro, sai livre, enquanto o outro pega uma pena pesada. E, se os dois optarem pela traição, ambos ficam atrás das grades.
A perversidade da coisa é que, racionalmente, sempre vale a pena trair. Afinal, você e seu comparsa estão incomunicáveis, e ninguém gostaria de correr o risco de ficar na posição de trouxa, demonstrando lealdade enquanto o “companheiro” pode sair da cadeia te colocando na fogueira. O exemplo da cadeia é só uma das encarnações do dilema do prisioneiro. Pode-se muito bem argumentar que a corrida nuclear é uma versão apocalíptica do jogo: não é à toa que os americanos costumavam dizer Better dead than red (Melhor morto do que comunista) no auge da Guerra Fria. Como justificar o desarmamento se seu oponente tem um arsenal suficiente para acabar com a sua civilização? É melhor se armar até os dentes também e garantir, pelo menos, que você também vai aniquilar o safado caso alguém seja estúpido o suficiente para apertar o botão.

A sombra do futuro
Há, no entanto, uma saída honrosa para o Dilema do Prisioneiro. Basta que, no dizer dos especialistas em teoria dos jogos, a “sombra do futuro” seja longa. Quer dizer, é necessário que interação entre os oponentes ocorra durante um intervalo significativo de tempo, e não numa única vez. No fundo, isso está muito mais próximo do mundo real: como ninguém vive no anonimato, é bem provável que, se passarmos a perna em alguém no nosso trabalho ou no nosso grupo de amigos, essa pessoa terá a chance de revidar no futuro.
Ora, anos atrás, o cientista político americano Robert Axelrod organizou uma série de competições envolvendo o Dilema do Prisioneiro com uma “sombra do futuro” longa, de 200 rodadas. Axelrod convocou cientistas de todos os calibres para elaborar estratégias – programas de computador que competiriam uns contra os outros para ver quem levaria mais pontos no jogo. A pontuação era o equivalente matemático dos resultados do dilema: uma recompensa considerável quando os dois jogadores cooperassem, uma recompensa gigante para o traidor no caso de seu oponente não trair, uma punição severa para ambos caso os dois traíssem.
Dezenas de programas diferentes se enfrentaram, num esquema todos contra todos, e a pontuação foi computada. O vencedor? Um programa tão simples que seu criador, o finado psicólogo americano de origem russa Anatol Rapoport (1911-2007), só precisou de quatro linhas de código computacional para montá-lo. Seu apelido? “Tit for Tat” ou “Olho por Olho”. As instruções envolviam, primeiro, sempre cooperar na rodada inicial do jogo. Depois, o programa era orientado a copiar a jogada de seu oponente na rodada anterior. Se ele cooperava, o Olho por Olho também cooperava; se traía, ele retaliava a traição.
Duas características do Olho por Olho saltam aos nossos olhos como essencialmente morais. Ele não é maldoso, ou seja, nunca inicia um ciclo de traições. E não é rancoroso: se você for bonzinho com ele, a cooperação será constante, e ambos sairão lucrando sem parar. Finalmente, ele não é um idiota: deixa claro que há conseqüências sérias para o ato de passar a perna nos outros só para levar vantagem. Essa combinação se mostrou tão vencedora que nenhuma simulação do Dilema do Prisioneiro até hoje conseguiu trazer à baila um programa que derrotasse o Olho por Olho.
Longe de mim querer bancar o Obi-Wan Kenobi, mas tudo isso talvez indique que deveríamos confirmar mais nos nossos instintos sociais e ter uma visão menos pessimista de como a seleção natural nos moldou. Gentileza e compaixão, se temperadas com justiça, aparentemente são características de vencedores, e não de perdedores, como às vezes querem nos fazer crer. Nos dilemas do prisioneiro que enfrentamos todo dia, dá para tentar fazer com que todo mundo deixe de ver o sol nascer quadrado.


Por: Reinaldo José Lopes

Nenhum comentário: